A Selva do Tudo Pode está assustada. Como aqui parece tudo poder acontecer, teme-se que os bichos fiquem sem água e logo. O problema não é de hoje, mas ao invés de resolvê-lo em definitivo os administradores têm adotado medidas paliativas e a conta gotas. É sempre assim. Lamentavelmente a memória dos bichos é tão curta que eles já esquecem que num passado não tão distante se cogitou trazer água da floresta vizinha e “disseram” que de lá não vinha. Puro egoísmo. Todos sabem que alguns dos bichos lá de baixo não gostam dos de cá e que um deles, certo dia, até nos batizou de “Macacos da Serra”.
Depois dos últimos relatos sobre a Selva, principalmente quando se falou da forasteira Belinha, a cachorra, que parece já ter feito o caminho de volta, a vida neste recanto continua hostil e continuará sendo enquanto os bichos não criarem vergonha e mandar de volta quem nunca deveria ter chegado por estas bandas. Falando em mandar de volta, lembrei do galo que administra a floresta. Esse deixou de ser tratado pelos seus cúmplices no diminutivo e passou a ser bajulado no aumentativo ( (ão) . Era o que faltava! Mas maquiagem feita de última hora é como pintar quebra-molas com cal: a intenção é boa, mas não tem resultado duradouro. Espero que ninguém esqueça o ditado, aqui parodiado, muito conhecido de todos: “cometer erro uma vez é descuido, duas vezes já é burrice”.
O resultado das últimas eleições deixou os bichos, ligados à administração da floresta, desnorteados. Passaram a vida inteira em cima da carne seca, fazendo o que bem queriam e quase sempre confundindo público com privado, que se tornou muito difícil para eles aceitar o desfecho. Quando a vaca mudou de curral e o leite escasseou, ficaram ensandecidos. Importante não deixar de dizer que a mudança de curral faz pouca ou quase nenhuma diferença quando esquecemos que o foco dessa disputa toda são os bichos carentes. É preciso acima de tudo entender que decisões isoladas, unilateral, apenas colocam a perder os sonhos sonhados juntos. Jamais devemos esquecer também que é isso o que eles querem. É uma pena que quem sempre esteve do outro lado, sendo marginalizada, não saiba aproveitar esse momento.
A vida na floresta de fato é meio louca. A loucura infelizmente não escolhe lado, ela não tem preconceito. Falando nisso lembrei-me de vaca. Elas estão por aí fazendo presepadas, servindo de paparazzo. Algum bicho educador não estranhe se encontrar, por acaso, sua imagem postada em algum sítio. A intenção é intimidar porque aqui “é chicotada e tal”. Assim, se algo de bom por ventura aconteça, entenda sempre como descuido deles. Eles têm espiões aos montes por aí que são pagos também para ovacionar os malfeitos e algo mais. Como ninguém sabe mesmo qual a função do segundo ou de qualquer escalão nessa história, hoje eles são uma coisa, amanhã outra, não custa lembrar que “o seguro morreu de velho”. Para eles tudo é uma questão de conveniência. A política deles lembra a ditadura, o totalitarismo.
No passado eles faziam isso e continuam querendo perpetuar, parece está no sangue. Como o que temos hoje é descendente próximo do coronelismo, também de ranços da ditadura que aqui deixou suas marcas, é bom ser precavido.
Até os bichos da Assembleia, que fazem as “leis e fiscalizam”, entraram na ciranda dessa Selva de Pedra. Um deles chegou a dizer que ser o que é “não vale nada”, isso tudo chateado porque não conseguiu colocar sua vontade acima da lei. Mas de fato alguns deles pouco valem, estão mais para zero à esquerda, por não terem quase nenhum compromisso com aqueles que lhe outorgaram o mandato. Há quem diga que alguns deles querem apenas fazer de conta, banalizar ainda mais o que a maioria nunca levou a sério ao longo dos anos. Para se ter uma ideia mais precisa do ambiente nebuloso, numa das reuniões, um deles, (Fiscal da Assembléia dos Bichos) achou de comparecer para apreciar matérias usando bermuda, traje nada adequado para a ocasião. Outro, mais tarde, compareceu a Sessão visivelmente embriagado querendo falar o que nem sóbrio consegue.
Nesse mundo de faz de conta, cheio de problemas, tem ainda os bichos puxa-sacos. Esses são os mais prestigiados. Nem adianta nominá-los, porque alguns nem possui identidade, personalidade, caráter que justifiquem aparecer. Por puxarem as bolotas mais do que os outros, são privilegiados e intocáveis, alguns ganham sem nunca comparecer ao local de trabalho. Outros assumem funções fictícias. Imagine contratar bichos como se eles fossem coordenadores de educação e na prática o trabalho ser de porteiro, digitador e até ófice-boy. Como diz um bicho da floresta: “Isso é brincadeira!”. Ainda “querem” que os filhotes que estão nas escolas sejam instruídos corretamente. E a culpa?
Na onda do desmantelo, do desgoverno em que está imersa a Selva, nos arrumadinhos que são feitos a luz do dia, sem nenhuma cerimônia, jardineiro tem contrato rasgado e imediatamente é empossado secretário de finanças adjunto, tudo para não ser forçado pela lei a regar e adubar os poucos jardins que temos. Aconteceu com um dos bichos da Selva. E pelo jeito esse vai ser mais um daqueles casos que envelhece, vence o prazo e não tem o desfecho que a sociedade espera, porque “eles são mala” e infelizmente a justiça é lenta e nem sempre eficiente.
Desafiando o Código de conduta estabelecido na Selva, um bicho funcionário, da classe proletária, me falou que preconceituosamente era chamado, pelas costas, por dois de seus superiores indiretos, de São Benedito. Como se não bastasse, ele (vítima), num dado momento esteve diante de seu superior e, questionado sobre a qualidade do seu serviço, disse que a culpa era do instrumento de trabalho, que devido à falta de manutenção estava cego (precisando ser amolado). Imediatamente ouviu do administrador, o galo, seu chefe maior, que para resolver o problema só fazendo um exame de vista. Se você achou a resposta o fim da picada e uma piada sem graça, paciência, porque ainda não acabou. Veja essa. Outro bicho funcionário, por ter cumprimentado um dos fiscais da Assembleia dos Bichos numa partida de futebol, com um simples aperto de patas, foi julgado quase a revelia e condenado. O galo, o chefe, lhe chamou e disse que por causa do ocorrido, que soube da boca de um “fiscal” em fim de carreira, ele desse adeus ao serviço extra, que lhe era garantido todos os dias.
Assim se passa mais um dia na Selva do Tudo Pode, um dia como outro qualquer, onde o universo imaginário pode se confundir com o real.
Moral: O poder pode fazer mal quando não se está preparado para recebê-lo.
Luciano Pinheiro de Almeida, historiador, professor, sindicalista e vereador pelo Partido dos Trabalhadores (PT) de Luís Gomes/RN.
FONTE: SERRA LUIS GOMES